O sucesso de Stieg Larson e sua “Trilogia Millenium” gerou frutos tanto na literatura, quanto no cinema. Houve então uma busca óbvia por material semelhante e que trouxesse consigo esse misto de suspense, personagens poderosos e assassinatos excêntricos. O Guardião Invisível é um desses filhotes, mais precisamente, um filho basco e com certa personalidade. Não que isso signifique muita coisa em termos de qualidade.
O livro, primeiro da “Trilogia Baztan” foi lançado em 2013 e logo foi vendido para o mesmo Peter Nadermann que produziu, justamente, os três filmes adaptados na série de Larson. Portanto, não existe coincidência, mesmo com o foco regional, O Guardião Invisível vira filme para aproveitar o interesse no gênero. O problema maior é que a produção dirigida por Fernando González Molina nunca consegue ultrapassar essa barreira e permanece sempre com ar de cópia menos interessante.
A trama segue uma dinâmica semelhante, por mais que tome caminhos um pouco mais novelescos e até místicos. Amaia Salazar (Marta Etura) é uma investigadora da polícia de Pamplona, norte da Espanha, seu passado quer ser esquecido, mas um currículo que chega até uma especialização do FBI a coloca no comando da investigação da morte misteriosa de uma garota em Elizondo, sua cidade natal no meio de Baztan, uma região em um vale cercada de florestas e onde parece chover dia e noite.
O problema é que Amaia precisa então voltar para sua cidade, encarar seus fantasmas e ainda desvendar não só esse crime, mas alguns outros que começam a se ligar e fazem com que a cidade fique na mira de um serial killer.
Estruturado através de uma série de coincidências, O Guardião Invisível se torna aquele tipo de história onde é difícil de acreditar que justamente aquela personagem iria estar ali, naquele momento e naquele lugar, para ser a investigadora de um crime que acaba remetendo a uma série de acontecimentos ligados a ela e à sua família. Tudo bem, a literatura conta bastante com as conveniências do destino para que suas histórias funcionem, mas é impossível não permitir que isso soe preguiçoso, ainda mais diante da sensação de que é possível fazer mais, principalmente em comparação ao emaranhado estrutural que Stieg Larson faz em O Homem que Não Amava as Mulheres para colocar seus protagonistas naquela posição de modo crível e empolgante.
Com isso em mente, com essa conveniência atracada em O Guardião Invisível, é possível aproveitar um pouco da história e do como a trama vai sendo construída através de um misto de provas, inseguranças da protagonista e até um misticismo que parece pairar na névoa da região, Navarre, próxima do chamado “País Basco” e que traz dele muito de seu folclore e crenças. Entre tarô, bruxas e até o Basajaun, protetor das florestas de Baztan, os crimes remetem a pontos do cristianismo e entendem o quanto a extravagância dos assassinatos e de tudo que rodeia eles pode ser suficiente para entreter quem quer apenas mais um filme de suspense genérico.
Não importa se a investigação parece um grande brainstorm sobre um cadáver ou se algumas conclusões e ligações estão lá… bom, porque devem estar ou senão a trama não chegaria ao seu final. Quem souber lidar com isso, com o clima de novela e suas famílias disfuncionais e não se importar com o caminhão de pontas soltas deixadas para os outros dois filmes, O Legado de Ossos e Oferenda à Tempestade (todos produzidos pela Netflix), deve acabar se divertindo com O Guardião Invisível, mesmo sem ele ser absolutamente nada original.
“El Guardián Invisible” (Esp/Ale, 2017); escrito por Luiso Berdejo, a partir do livro de Dolores Redondo; dirigido por Fernando González Molina; com Marta Etura, Elvira Minguez, Nene, Francesc Orella, Itziar Aizpuru, Benn Northover e Colin McFarlane.