[dropcap]E[/dropcap]ste documentário tem por objetivo inicial fazer você cair de sono. Isso porque a diretora/roteirista/atriz portuguesa Teresa Villaverde evita enquadrar a câmera para nos prender a atenção. Ela prefere uma abordagem mais despojada. A resposta adequada e respeitosa para um filme desses é ser um espectador também despojado, que começa a roncar antes dos dez primeiros minutos de projeção.
Mas isso pode ser algo injusto de se fazer, pelo menos em um ou dois momentos do filme, principalmente próximo do final. Coloque seu despertador, pois o começo não é necessário. O filme, porém, é sobre o cineasta italiano Tonino De Bernardi na região de Piemonte (Itália), sobre seu cinema underground italiano, mas também sobre sua família e a troca entre gerações. Villaverde caminha com Bernardi até os primórdios de sua origem, através de seus avós, como morreram, etc.. Em um primeiro momento entrevista sua avó, muito simpática, mas apesar da naturalidade, este parece um caminho já percorrido quando ela fala sobre a época do fascismo que viveu.
Sim, esta é uma geração que viveu o fascismo de verdade, antes de George Orwell nos alertar que no futuro essa e outras palavras seriam reinterpretadas ao bel prazer de adversários políticos. Não deixa de ser interessante voltar brevemente ao passado pelos olhos de quem o viveu, mas quando nem a câmera está interessada em focar ou enquadrar o ronco do espectador continua.
Da mesma forma, uma mini-“entrevista” com dois de seus netos assemelha-se mais a um vídeo de família, onde cada segundo parece irrelevante, pois é a visão de crianças sob a máscara do social. Elas já perderam a espontaneidade, assim como quase todos que participam do filme, relatando morosamente textos em apenas um tom, tentando de todas as formas te fazer perder o fio da meada. Conseguem. Várias vezes.
Mas há um momento mais poderoso onde o cineasta em si comenta quando ele descobriu que para ser cineasta bastava ter uma câmera. É poderoso porque a diretora filmando parece, ela própria, ter ganho também a sua primeira câmera, sequer sabendo o botão para parar. E parece ser o único momento autêntico de todo o longa (longuíssimo).
Esse detalhe me faz lembrar de outro filme dessa Mostra, O Criador de Universos, que também parece nos mostrar que essa ideia de hoje em dia qualquer um poder filmar não é tão boa assim.
Quase sempre usando sua câmera como microfone, o filme está querendo encontrar momentos dignos de ser filmado, como a face do cineasta quando ele vai falar sobre o suicídio do avô. Fica claro que a documentarista resolve pegar a câmera porque o momento merece, o que nos ajuda a desvendar o resto do filme: quase mais nada merece ser filmado ou visto.
Galileu descobriu que a densidade depende da temperatura, criando assim seu termômetro que leva o título deste filme. Pela análise da densidade narrativa podemos também concluir que a temperatura tende a zero kelvin.
Esse texto faz parte da cobertura da 42° Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
“O Termómetro de Galileu” (Portugal, 2018), escrito e dirigido por Teresa Villaverde, com Tonino De Bernardi, Mariella Navale.