Ouija: A Origem do Mal | #020 | 666 Filmes de Terror

Seria muito mais fácil manter a mediocridade do filme original. Repetir a história de modo desastrado para fazer mais uns dólares, já que todo mundo gosta de um terror baratinho com uns sustos e é bem simples fazer isso virar lucro. Portanto, seria realmente fácil Ouija: A Origem do Mal ser só mais uma continuação qualquer e que todo mundo esqueceria. Mas nada que tem o Mike Flanagan da direção se deixas ser “só um terror”.

Do original talvez Ouija só tenha o fiapo de história que estava dentro do fiapo de roteiro do primeiro. Mas até aí, o roteiro de próprio Flanagan em parceria com Jeff Howard, faz questão de quebrar algumas expectativas e contar sua própria história. Obviamente uma história melhor.

Howard já tinha trabalhado com Flanagan em O Espelho e Sono da Morte. Ambos com uma coisa em comum: a humanidade. E talvez esteja aí o principal segredo de Flanagan, algo que ele persegue até hoje em seus filmes e séries e, cada vez mais, enxerga o terror como um gênero que é o resultado de um drama de pessoas diante de uma dificuldade que coloca-os em uma situação que eles não conseguem lidar.

A óbvia paixão de Flanagan pelo escrito Stephen King vem desse mesmo lugar. Depois de Ouija já foram duas adaptações (Jogo Perigoso e Doutor Sono) e já está trabalhando em uma terceira (“The Life of Chucky”). Ouija – A Origem do Mal tem essa pessoalidade, como se, antes de qualquer terror, monstro ou susto, você tivesse que conhecer os seres humanos.

Nesse caso, a vidente Alice Zander (Elizabeth Reaser). Bom, nem tão vidente assim, já que tem a ajuda das duas filhas, Doris e Lina (Lulu Wilson e Annalise Basso), para fazer com que suas sessões sejam realistas o suficiente para satisfazer seus clientes saírem de lá convencidos e, por que não, felizes. Flanagan está realmente preocupado em colocar o espectador próximo dessas mulheres e da sensação de que elas não estão fazendo nada de tão ruim assim.

Esse subterfúgio narrativo de Flanagan é sempre um acerto. Seus personagens não estão ali para serem vítimas de um fantasma qualquer, eles precisam sobreviver àquilo, pois os espectadores estão próximos deles e acreditam no quanto eles merecem essa felicidade. Mas Flanagan quase nunca está interessado em criar uma história que seja boa para o que os espectadores querem, e sim para aquilo que sua trama precisa passar.

Três anos antes de Ouija, Flanagan colocou um casal de irmãos obcecados por um espalho que tinha uma maldição. Uma necessidade de enfrentar aquilo para limpar seus passados. E não importa o quanto você estiver com eles, nunca será suficiente para salvá-los da tragédia anunciada. Esse é o campo onde as ideias de Flanagan florescem.

Certas ou erradas, enganando ou ajudando, a vidas das três vira de pernas para o ar quando a filha mais velha tem a ideia de incorporar nas sessões uma tábua Ouija. O nome, Ouija, é da Hasbro, assim como essa tábua com as letras que todo mundo conhece, mas a ideia de falar com espíritos através das letras escritas em uma mesa vem de mais de 3 mil anos atrás lá na China. O que importa é que nos anos 50 era possível comprar um jogo desses em qualquer supermercados dos Estados Unidos, que é o que a mãe faz.

O problema é que elas acabam descobrindo que a filha mais nova realmente consegue usar a tábua Ouija com o propósito sobrenatural, o que ajuda nos negócios, mas logo faz com que a pequena menina comece a se comportar do exato jeito que os fãs de filmes de terror mais querem. Flanagan então faz os espectadores ficarem próximos a tudo aquilo sem a menor pena de ninguém.

Os sustos estão lá, mas mais do que isso, o que enterra o espectador na poltrona (ou no sofá) é essa sensação de que é impossível qualquer um daqueles personagens lidarem com aquilo de um jeito que seja suficientemente poderoso para salvá-los. Mas ou menos o que acontece com qualquer filme de terror, mas a diferença fica na sensação de que no resto do gênero isso só é capaz diante da burrice de alguns personagens. Flanagan não se permite isso, afinal o espectador vai ter certeza do os personagens estão enfrentando.

Tanto em Ouija – A Origem do Mal, quanto em praticamente toda sua filmografia, Flanagan se sente confortável com a clareza com que lida com seus monstros e perigos. Não existe dúvida de que aquele troço esguio, preto, gigante e meio sem face acabará com aquela família. Do mesmo jeito que não esconde a possessão da filha menor com qualquer dúvida sobre ela ser ou não a pequena e demoníaca vilã. Flanagan não esconde suas peças nesse tabuleiro e só sobra ao espectador observar as jogadas meio inúteis dos outros personagens. Só lhes resta torcer.

Todas essas ideias são valorizadas pelo olhar de Flanagan. Suas composições são precisas e, ao mesmo tempo, sabem ser dinâmicas. Ao mostrar o ataque da criatura, deixar que a cena se complete sem cortes e com tudo acontecendo dentro de um mesmo olhar, beirando um sadismo visual que é perfeito para o filme. Um susto pode vir de um canto escuro, mas o que pulou de lá, não foge depois, é sempre preciso encarar esse perigo de frente. Esse é o jogo de Flanagan.

É esse “jogo” que, por exemplo, faz com que um filme tremendamente esquecível como Ouija, tenha uma continuação que faça com que sua ideia inicial ruim ganhe qualidade o suficiente para se tornar um filme tão melhor. Um filme que se encaixe perfeitamente bem na filmografia de Mike Flanagan, com certeza um dos cineastas mais importantes do gênero nos últimos tempos e que, com certeza, fará com que Ouija – A Origem do Mal seja lembrado, enquanto o primeiro será esquecido.


“Ouija: Origin of Evil” (EUA, 2016); escrito por Mike Flanagan e Jeff Howard; dirigido por Mike Flanagan; com Annalise Basso, Elizabeth Reaser, Lulu Wilson, Henry Thomas, Parker Mack e Halle Charlton


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