Para Minha Amada Morta é um filme que começa como drama, mas logo se revela um thriller psicológico envolvente. Não se trata muito de ação, mas de possibilidades. E dentro das possibilidades, a de fazer o mal é onde o filme impera, evocando em seus momentos sempre a questão: o que ele irá fazer em seguida?
A história começa com um pai e um filho. Ambos estão de luto pela perda da esposa/mãe. O marido, se recompondo, encontra vídeos caseiros da mulher, desde sua infância até uma descoberta incômoda: a traição.
No entanto, não parece ser o ato de trair que incomoda Fernando (Fernando Alves Pinto), embora este seja o guia para o espectador, mas uma frase que sua esposa diz no vídeo para seu amante: “você foi a melhor coisa que já me aconteceu na vida”.
Disposto a adentrar na vida do sujeito, Fernando o rastreia facilmente de seu trabalho. Fotógrafo da polícia, descobre que o ex-amante (Lourinelson Vladmir) de sua mulher fora preso, mas está hoje livre e com uma vida pacata e religiosa com mulher e filhas. Ele está alugando a pequena casa dos fundos, e é aí que Fernando irá começar a ser uma presença física para o sujeito.
Disposto a explorar os sentimentos de Fernando conforme ele interage com a recatada família, tanto a edição de som e a trilha sonora, quanto os enquadramentos e a movimentação da câmera do diretor, exploram a mesma coisa: o desconforto, a claustrofobia, a metáfora do maligno. Fernando vai aos poucos se descaracterizando como ser humano frente ao espectador, mas nunca parece deixar de ter razão. Ele está (ou sempre foi) psicótico, mas o roteiro não o torna um monstro, mas um observador do cinismo e da hipocrisia da sociedade e da religião.
A câmera, sempre com uma profundidade rasíssima, só utiliza o ponto de vista de Fernando, enquanto seu desafeto e familiares se posicionam em um fundo sem foco. Esse é o nível do ódio e desorientação que Fernando e o espectador vivenciam.
A direção de Aly Muritiba – que também escreve o roteiro de Para Minha Amada Morta – mantém tudo sob controle, e talvez esse seja o pecadilho do filme, que prefere não ousar, mas apenas conjecturar. No entanto, como se pode testemunhar, apenas o “ele pode fazer” já é incômodo o suficiente para ganhar a total atenção de quem assiste. Um feito e tanto em um filme com poucos acontecimentos impactantes.
“Para Minha Amada Morta” (Bra, 2015), escrito e dirigido por Aly Muritiba, com Fernando Alves Pinto, Mayana Neiva, Lourinelson Vladmir, Giuly Biancato, Michelle Pucci