Sergio | Um pouco de esperança em tempos tão difíceis


[dropcap]E[/dropcap]m tempos tão difíceis, é ótimo poder acompanhar a vida de alguém que fez tão bem para o mundo como o ex-alto comissário da ONU, Sérgio Vieira de Mello no filme que leva seu nome, Sergio. Só isso, seu nome, sem subtítulo ou sobrenome. Um filme simples com intenções simples e um resultado poderoso.

Parte dessa força vem do tamanho gigantesco do personagem, a outra parte vem do trabalho do experiente documentarista Greg Barker, que já tinha até passado pelo tema em 2009 com o documentário homônimo (Sergio), que também pode ser encontrado na Netflix, assim como esse lançamento que leva para a tela os últimos dias desse brasileiro que ajudou a criar um mundo melhor para muita gente.

Barker sabe disso, conhece a história, então não precisa arrancar muita coisa da realidade, apenas encaixar essa trama de um jeito que construa melhor esse personagem. Para isso, estrutura o filme em dois momentos bem específicos: os últimos momentos de Sergio Vieira de Mello (Wagner Moura), vítima de um atentado em Bagdá; e o momento onde ele conhece sua esposa Carolina (Ana de Armas) em uma missão da ONU no Timor Leste.

No primeiro momento, Sergio tenta entender como controlar uma situação aparentemente incontrolável da capital do Iraque pós invasão do governo americano. Um cenário politicamente caótico e que sofre com a intervenção violenta dos Estados Unidos, mas que a ONU, através do brasileiro, tenta apaziguar, rumar para uma democracia e, antes de qualquer coisa, ajudar sua população.

O destino trágico dessa tentativa é conhecido por todos e a trama de Barker acompanha bem de perto esses últimos momentos de Sergio Vieira de Mello, mesmo soterrado após o atentado que acabou matando-o. Mas a construção do personagem vem através de seu famoso período no Timor Leste, onde colocou em prática o que talvez tenha sido sua principal qualidade profissional: a resolução de conflitos.

Enquanto ajuda o Timor Leste a caminhar para uma independência democrática, o protagonista encontra, não só esse caminho apaziguador, como um novo amor. Barker ainda aproveita esse momento para discutir as falhas e inseguranças desse personagem, aparentemente diante de uma responsabilidade muito maior do que ele. Escrito pelo mesmo Craig Borten de Clube de Compras Dallas, a partir do livro de Samantha Power, Sergio é então um estudo de personagem que caminha tranquilo e sem pressa, quer somente presta essa homenagem merecida a esse personagem incrível.

O roteiro estabelece bem esses dois momentos e nunca perde o ritmo. Não busca um clímax ou surpresa, mas sim trata tudo de modo sensível e limpo. Em Bagdá não é o momento para construir o personagem, portanto coloca tudo isso no Timor Leste. Quase um segundo ato inteiro onde é possível ver o personagem, não só trabalhando e se apaixonando, mas criando um contraponto onde ele precisa lidar com as falhas com a família e o aparente fracasso na vida pessoal. O coloca em uma encruzilhada onde sua vida pessoal e profissional não podem seguir o mesmo caminho.

Barker sabe quem são as estrelas de seu filme e que o texto é uma delas, portanto usa sua experiência em documentários para tentar se afastar da ação de modo seguro e impessoal, ao mesmo tempo que busca uma câmera viva e que não parece querer descansar, mas sim cobrir o máximo de história que conseguir. Talvez isso endureça um pouco o resultado de alguns momentos mais sensíveis, como uma caminhada do protagonista em ruinas do Timor Leste, o que não atrapalha, mas tampouco cria uma cena que poderia sem mais lembrada.

As duas outras estrelas do filme de Barker são os dois protagonistas. Ana de Armas tem um pouco menos de oportunidade durante grande parte do filme, mas quando é necessário construir, principalmente, a dor dessa perda, bem lá para o final, a atriz cubana aproveita para, mais uma vez, surgir como um dos grandes achados de Hollywood nos últimos anos.

Wagner Moura é talvez o maior acerto do filme. Firme e seguro, Moura mergulha de cabeça no personagem e tenta ao máximo sumir por trás de um personagem grande em suas ações e que precisa passar uma segurança pelo lado de fora que o ator consegue combinar bem com aquela fragilidade citada lá para cima no texto. O Sergio Vieira de Mello de Moura é alguém que toma a tela e aproveita o estilo de Barker, que não corta a cena no fim do diálogo, e deixa Moura aproveitar isso com o olhar e com um trabalho corporal preciso e que constrói um sentimento realista.

Barker e Borten não buscam apenas contar uma história, mas sim tentam entender a personalidade de alguém que realmente tem que conviver com os espólios desses mundos onde os homens brincam de guerra. Querem contar a história desse grande homem que fez com que sua missão de vida fosse salvar essas pessoas. Tudo isso em um filme que se encaixa perfeitamente bem no tamanho de sua televisão e é a oportunidade perfeita para acalentar um pouco os corações desesperados de um mundo de gente que está precisando viver em tempos tão difícieis.


“Sergio” (EUA, 2020), escrito por Craig Borten, à partir do livro de Samantha Power, dirigido por Greg Barker, com Wagner Moura, Ana de Armas, Brian F. O´Byrne, Bradley Whitford, Garret Dillahunt e Clemens Schick.


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Trailer do Filme – Sergio

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