[dropcap]T[/dropcap]odo mundo ama a Turma da Mônica. Uma parte gigante dos brasileiros aprendeu a ler com os gibis do Maurício de Sousa, assim como uma parte um pouco menor ficou apaixonado pela série de Graphics MSP que surgiu alguns anos atrás e trazia os personagens clássicos sob uma visão atualizada de grandes artistas do mercado de quadrinhos. Turma da Mônica – Laços, primeiro filme live action dos personagens, é o resultado de todo esse caldeirão. Mas sempre tem um “mas”.
Dirigido por Daniel Rezendo (de Bingo e indicado ao Oscar por seu trabalho de montagem em Cidade de Deus), Laços nasce dessa história escrita e desenhada por Victor e Lu Caffagi, nela, o cachorro floquinho some e cebolinha e seus amigos partem em uma aventura para encontrar o “cacholinho”.
O filme é escrito pelo mesmo Thiago Dottori que escreveu VIPs e vem escrevendo a série Psi. Portanto, se uma coisa que Laços não sofre é de falta de experiência de seus realizadores. E os acertos do filme estão justamente aí.
Laços é sensível e divertido, assim como emocionante, já que coloca na tela alguns personagens que estão no coração de muita gente. Tem ainda uma carga brutal de “fan services”, o que em certo momento beira o exagero metalinguístico e faz o quarteto encontrar com o próprio criador em uma banca de jornais vendendo os gibis estrelados por eles. Sutilezas à parte, a presença de personagens como o Cranícola ou a participação de Jotalhão e Horácio são incríveis, mas a necessidade de “mostrar todo mundo” beira o exagero e a necessidade de fazer com que a plateia fique “caçando pokemon” é cansativa e meio sem foco.
Bastava para o filme acompanhar esses quatro personagens em sua aventura e grande parte da diversão já estava garantida. Com carisma suficiente para que suas inexperiências não atrapalhem em nada Giulia Benitte (Mônica), Gabriel Moreira (Cascão), Laura Rauseo (Magali) e Kevian Vechiatto (Cebolinha) dão conta do recado na maioria esmagadora do tempo, pecam, justamente, quando Rezende decide explorar neles uma capacidade de atuação que eles não têm.
Enquanto os quatro interagem entre si, sobra simpatia e aquela vontade de estar próximo ao grupo participando dessa aventura. E por mais que Mônica e Cebolinha sejam o foco principal da narrativa, Cascão e Magali, mesmo com muito menos material a explorar, jogam com a sutileza e têm resultados muito mais interessantes e divertidos, principalmente quando se pegam sendo uma espécie de “voz da razão” meio sarcástica e incrivelmente divertida e pontual.
Rezende, por outro lado, olha para seus protagonistas com o desejo de arrancar deles atuações exageradamente emocionais, principalmente de Vechiatto. Em certo momento permanece tanto tempo olhando para o garoto esperando por uma lágrima que é difícil não dispersar. É lógico que esse choro irá emocionar o espectador no escuro do cinema, mas o sentimento já estava lá, bastava mostrar o olhar perdido por um segundo.
O que nos leva talvez ao maior problema de Laços: o próprio Rezende. Mesmo incrível na maior parte do tempo, e comandando um terceiro ato incrivelmente empolgante, o diretor falha ao permitir que o foco da história saia de perto dos quatro personagens. Ninguém se importa com esse arco explicando as razões do Homem do Saco, muito menos a calvície do Seu Cebola importa mais do que para ser usado em uma “piada de fundo”. Esquecendo uma “parte do corpo”, Laços tinha tudo para ser uma versão do Conta Comigo da Turminha do Bairro do Limoeiro e isso seria fantástico.
A dinâmica entre os quatro é apaixonante e seguraria o filme sem qualquer esforço. Até os percalços dessa jornada são um espetáculo à parte, como a incrível participação de Rodrigo Santoro sob os cabelos encaracolados do Louco (que não está na HQ, mas aqui é uma das coisas mais divertidas do filme).
Mas todo mundo ama a Turma da Mônica, incluindo o Daniel Rezende, que, por mais que falhe em certos rumos e faça um trabalho visualmente bem aquém de seu último em Bingo, ainda assim entrega para o público tudo aquilo que ele espera. Não vai mais longe, como as Graphics MSP por exemplo, mas não o faz insegurança e também por ainda terem que “testar o terreno”. De qualquer jeito, todo mundo ama a Turma da Mônica e Laços só fará com que mais gente ainda os ame.
“Turma da Mônica: Laços” (Bra, 2019), escrito por Thiago Dottori, à partir da história em quadrinhos de Vitor Cafaggi e Lu Cafaggi, dirigido por Daniel Rezende, com Giulia Benitte, Kevin Vichiatto, Gabriel Moreira, Laura Rauseo, Rodrigo Santoro, Monia Iozzi, Ravel Cabral, Fafá Rennó e Paulo Vilhena