[dropcap]D[/dropcap]ois anos atrás, a crítica de Vingadores começava com “E a Marvel conseguiu”. De lá para cá foram mais quatro filmes para preparar o terreno para Vingadores 2: A Era de Ultron, e o que se pode dizer disso é que a Marvel conseguiu mais uma vez. Na verdade não só conseguiu, como ainda fez mais.
Em poucas palavras, sem colocar em pauta relativismos como quem é melhor que quem (mas já colocando!), a grande verdade é que A Era de Ultron é um filme maior, mais complexo, mais empolgante e muito mais divertido que o primeiro, e não só por ser uma sequência e ter aquela liberdade maior de partir pra ação, mas principalmente por ser um filme mais independente. Mais maduro.
Isso e uma vontade maior de ser diferente do primeiro, ainda que, no final das contas tenha a mesma estrutura. Essa rigidez é o que dá espaço para o diretor/roteirista, Joss Whedon, inovar. Isso mesmo, Era de Ultron é igual, mas é diferente.
Ao invés de um longo plano onde a câmera passa de personagem para personagem, como ápice de uma batalha final, aqui Vingadores 2 abre com essa espetacular sequencia em meio a uma floresta no leste europeu. Whedon continua então dirigindo um filme que parece ver seu visual nascer direto das páginas dos quadrinhos, e cada slow motion é a oportunidade perfeita para que o espectador possa curtir cada segundo estendido daquele momento. Como uma “splash page” que prende a atenção do leitor e o faz se perder no tempo enquanto admira toda aquela ação.
A floresta em questão é o caminho para o castelo (vulgo quartel-general) do Barão Von Stucker (que já tinha dado as caras na cena pós crédito de Capitão América: O Soldado Invernal), e o grupo de heróis está lá em busca daquele mesmo cetro que causou toda confusão no primeiro filme enquanto estava nas mãos de Loki. É ele (cetro) que acaba servindo de ponto de partida para que Tony Stark e Bruce Banner coloquem em prática um projeto de inteligência artificial que serviria para proteger o mundo. O projeto dá “um pouco certo demais” e cria o vilão Ultron, que sem sombra de dúvida alguma acaba se tornando o melhor antagonista do universo cinematográfico da Marvel.
E isso não é um exagero, já que o robô, vivido por captação de movimentos e voz por James Spader é, justamente (e curiosamente), o mais humano de toda lista de vilões. E parafrasendo o Tio Ben (afinal agora ele pode ser usado pela Marvel): Com grande vilões vem grandes filmes.
Ultron parece perdido em sua própria humanidade, em seu próprio objetivo de evoluir o mundo e “resolver” o “problema Vingadores” (e o que mais estiver a seu alcance). Mas o que está por trás dessa carapaça metálica é uma tristeza, uma solidão, uma falta de companhia para contar seus planos e um senso de humor psicótico que em alguns momentos gelará a alma de todos a sua volta. Bem diferente do unilateral e caótico Loki, Ultron tem um objetivo que faz sentido. Na verdade faz sentido demais, e isso é suficiente para que os Vingadores sejam pegos completamente desprevenidos e tenham que, realmente, dar a volta por cima antes do final apoteótico.
Ultron coloca em pauta a fragilidade física e mental dos heróis (esse segundo fator com a ajuda da presença dos gêmeos “aperfeiçoados”, Wanda e Pietro Masimoff, mais conhecidos nos quadrinhos como Feiticeira Escarlate e Mercúrio), e isso permite uma profundidade muito mais interessante a esse filme. De modo prático então, é isso que corrobora aquela afirmação lá do segundo parágrafo: Vingadores 2: A Era de Ultron é muito mais maduro.
Essa maturidade da trama faz mais bem ainda para os heróis, já que sem exceção, todos eles precisam enfrentar e entender as razões de estarem ali. Suas motivações então passam a ser mais claras, e o resultado imediato disso é um filme mais empolgante onde é mais fácil se identificar com essa trama. Onde todos ali deixam de ser passageiros em um arco narrativo que estava de passagem e atropelou eles. Era de Ultron então não só sobrevive sem a presença de mais nenhum filme, como é talvez quem melhor aproveite cada um dos personagens, mesmo em comparação com seus filmes solo.
Isso vem com um ótimo trabalho do elenco, já que nenhum deles nunca esteve tão à vontade dentro de seus personagens como agora. Nunca Chris Evans foi tão líder e tão Capitão América, assim como Chris Hemsworth nunca chegou nem perto do divertido Thor desse novo filme. O Tony Star de Downey Jr. agora parece menos espalhafatoso, mas isso só ocorre em razão de uma batalha interna que parece esmagar o personagem; mais do que nunca todo humor e exagero de Stark parece surgir como um barreira para que ninguém o enxergue como ele realmente é.
Tudo bem que o pequeno romance entre dois personagens acaba não soando tão natural assim e funciona muito menos do que o roteiro aparenta apostar, mas ainda assim todo desenlace disso ajuda mais ainda a compor a trama e acrescentar camadas no arco de cada um dos personagens. E falando em camadas, quem mais sai ganhando nisso é o Gavião Arqueiro de Jeremy Renner, que não só ganha mais espaço, como tem em mãos um personagem muito mais facetado e tridimensional que qualquer um dos outros, é fácil entender suas motivações e um truque que soa até covarde da parte de Whedon, faz com que o cinema inteiro torça por ele como por mais nenhum de seus companheiros.
E falando em espaço, Whedon ainda melhora o clima e permite que não só as piadas e o bom humor venham de mais lugares a não ser a boca de Tony Stark, como também consegue enxergar que ele não é mais o protagonista de seu filme, o que dá um ritmo incrivelmente maior para Vingadores 2: A Era de Ultron.
Um ritmo que faz o filme passar correndo, mesmo sendo o mais cumprido da Marvel até agora, mas isso graças a um roteiro enxuto e preciso, que não enrola e sabe que, junto com um design de produção igualmente impressionante, estão ali à serviço da ação. Da adrenalina. De tudo aquilo que se era esperado de Vingadores 2: A Era de Ultron, afinal pode parecer batido e repetitivo, mas não tenha dúvidas: A Marvel conseguiu mais uma vez.
“Avengers: Age of Ultron” (EUA, 2015) Escrito e dirigido por Joss Whedon, com Robert Downey Jr., Chris Hemsworth, Chris Evans, Samuel L. Jackson, Mark Ruffalo, Jeremy Renner, Scarlett Johansson, Aaron Taylor-Johnson, Elizabeth Olsen e James Spader