Wasp Network: Rede de Espiões | Mais uma fantástica história da vida real


Durante quase metade de Wasp Network: Rede de Espiões, se não fosse pelo subtítulo, seria impossível imaginar onde essa história iria chegar. O ritmo lento é então o objetivo claro dessa experiência onde a realidade se mostra, tanto surpreendente, quanto tediosa.

Talvez “tédio” nem seja a melhor opção para caracterizar essa ideia, talvez crie até uma falsa impressão. Baseado no livro de Fernando Morais, Os Últimos Soldados da Guerra Fria, e dirigido por Olivier Assayas, a intenção é mesmo arrancar o luxo dessa ideia. Quando falamos do mundo real, espionagem está muito mais perto do John Le Carré do que do James Bond.

O glamour passa rápido, cabe em uma montagem entrecortada e com surf music ao fundo, no resto do tempo, é preciso prestar atenção nos detalhes e duvidar daquilo tudo que você está vendo. Wasp Network por muito tempo não parece que irá chegar a lugar nenhum, chega bem rapidinho, depois continua em seu ritmo, mostrando o resultado de todo esse esforço, mas também nada de climático ou empolgante.

O filme conta a história dos pilotos Rene Gonzalez (Edgar Ramírez) e Juan Pablo Roque (Wagner Moura), ambos fogem de Cuba para lutar contra o regime de Fidel Castro do lado de lá do Golfo do México. Os dois se envolvem com a FNCA, liderada por Jose Baulto (Leonardo Sbaraglia), organização que ajuda fugitivos cubanos, mas que por trás dos panos, se mostra um braço de terrorismo que pretende combater o governo de Cuba através de ideias menos ortodoxas.

É lógico que se você não tivesse lido o subtítulo, talvez demorasse um pouco mais para “ligar os pontos”, mas já que emplacaram o spoiler logo de cara, Ramírez e Moura são parte dessa rede de espiões cubanos em Miami. Quase uma célula adormecida, já que por alguns anos até, a história acompanha o quanto os dois se estabelecem em suas novas vidas americanas.

Por mais que tudo isso pareça chato, Wasp Network, talvez seja realmente feliz naquilo que Assayas pretende. Durante essa primeira metade o seu objetivo é fazer o espectador esquecer a ideia de espiões, e irá esquecer. Ramírez constrói esse personagem ainda ligado pelo seu passado que ficou na “ilha”, com o abandono da esposa, Olga (Penélope Cruz), que precisa lidar com a ideia de o marido ser apenas um traidor da pátria. O piloto é o centro do filme, tomando as decisões ideológicas e acreditando na possibilidade de ele ser a alma dessa história, aquele herói pronto para sacrificar sua vida, família e companheiros, pelo seu país. Seu arco se fecha como desse herói perfeito.

Do outro lado, o Juan Pablo Roque de Moura é o produto maquiavélico de um regime que entende a importância da propaganda. Seu objetivo é maior e sua aura de estrela não larga seu personagem. O luxo de seu casamento com Ana Margarita (Ana de Armas) é o retrato de um plano complexo e que beira o inacreditável.

E se nesse primeiro momento sobra pouca emoção, Assayas só aposta nesse ritmo lento porque tem esse elenco incrível em mãos. Ramírez e Moura são um espetáculo à parte. Ambos extremamente à vontade com os personagens que criaram e tornando-os tão únicos que é fácil perceber o quanto ambos são dois lados de uma mesma moeda. As proximidades de suas funções vão em direções opostas à suas personalidades.

E por mais que o venezuelano Ramírez obviamente tenha mais facilidade com o castelhano, Moura não perde nada na mesma língua. Ainda que ambos já estejam acostumados com o inglês (pelas suas carreiras), quando começam a falar russo à vontade, fica claro o quanto os trabalhos de ambos precisam ser celebrados. Falando em idiomas, é fácil perceber os diversos sotaques do elenco, principalmente com o “argentinês” de Sbaraglia, mas nada disso chega a atrapalhar.

Principalmente, pois Wasp Network não é um filme com um protagonista, mas sim uma história que quer ser contada e reconhece o protagonismo de cada personagem. Todos têm seu tempo, já que essa história precisa deles, mas não tem a necessidade de se agarrar em um arco principal ou vontade de acompanhar só uma pessoa.

A habilidade de Assayas de construir essa ideia de multitrama é talvez o mais interessa de sua estrutura. Em certo momento deixa tudo de lado e acompanha uma série de atentados terroristas em Cuba, mas o faz criando um segmento inteiro de personagens e situações novas. Quase como um respiro narrativo, mas também uma vontade de expandir essa história e mostrar o quanto essa rede invisível e suas ações acabam resvalando violentamente em mais lugares do que somente Miami.

E se talvez o roteiro de Assayas soe pouco isento, é justamente porque ele não parece se esforçar para deixar qualquer impressão muito diferente dessa. Praticamente exime os Estados Unidos da história, pois sabe que usá-los como “inimigo comum” seria o caminho mais preguiçoso, Assayas cria em Cuba os dois lados desse conflito. Deixa os bom senso das palavras de Fidel Castro terem o amargor do discurso fascista. Tudo está no mesmo lugar e seu espectador terá que exercitar essa capacidade de fugir da dicotomia e do estar só certo ou errado.

Wasp Network é uma daquelas histórias que precisa ser contada, onde nem tudo é simples de julgar, mas mais do que isso, nos faz lembrar do quanto as melhores e mais fantásticas histórias não estão na cabeças dos escritores, mas sim na vida real.


“Wasp Network” (Fra/Bra/Esp/Bel, 2020); escrito e dirigido por Olivier Assayas, a partir do livro “Os Últimos Soldados da Guerra Fria” de Fernando Morais; com Penélope Cruz, Edgar Ramírez, Gael Garcia Bernal, Ana de Armas, Wagner Moura e Leonanrdo Sbaraglia.


Trailer do Filme: Wasp Network: Rede de Espiões

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