A Lenda de Candyman | Crítica do Filme | CinemAqui

A Lenda de Candyman | #018 | 666 Filmes de Terror

Por mais que no original o filme ganhe apenas a alcunha de “Candyman”, a versão brasileira talvez se encaixe melhor na ideia do novo filme da franquia criada por Clive Barker lá nos anos 80. A Lenda de Candyman é justamente sobre isso, sobre uma lenda.

Não que os outros não sejam, assim como o conto original de Barker o é, mas a ideia aqui é ir além disso e levar ao limite o conceito dele ser “um rumor, um escrito na parede”. Mais do que isso até, diferentemente dos outros filmes e da história curta, esse novo filme caminha para se tornar um conceito. E isso acrescente uma camada ainda mais interessante para esse remake/spinoff/reboot/continuação.

Sim, é difícil apontar o que A Lenda de Candyman realmente é, mas ao longo do filme o espectador vai percebendo que ele é tudo isso e não está preso a uma só jornada. O que pode ser um dos pontos mais interessantes do novo filme de Nia DaCosta. O roteiro fica nas mãos da própria DaCosta em parceria com Win Rosenfeld e do ganhador do Oscar Jordan Peele. Mas curiosamente, esse novo filme procura um lugar diferente daquele encontrado por Bernard Rose em 1992 (no filme original).

Rose já tinha em mãos um peso social que não vinha do material de Barker. Uma consciência de classe que passava pela gentrificação e até uma revolta da protagonista com seu privilégio branco. O filme de 92 ainda vai atrás de um contexto histórico para o assassino que passa pela violência sistemática da escravidão. Nada disso está no original de Barker, mas tudo isso continua dentro da história de DaCosta. Mas com um pouco mais de camadas.

DaCosta e Peele são negros e isso dá uma óbvia profundidade a toda nova experiência. Não existe ali uma bandeira simplista a ser levantada através de frases soltas e atitudes óbvias (como tinha um pouco no filme original). Essa nova sequência é uma obra ainda mais madura. Uma experiência que entende ainda mais, não só o material original de Barker, como o próprio filme de Rose.

Mas o filme busca um caminho diferente ao acompanhar Anthony (Yahya Abdul-Mateen II), um artista plástico negro que já esteve sob os holofotes do círculo artístico de Chicago, mas mesmo ainda jovem, começa a ter suas qualidades colocadas em dúvida. Até que esbarra com a história do antigo projeto habitacional de Cabrini-Green e a lenda de assassino que sai do espelho.

A Lenda de Candyman | #018 | 666 Filmes de Terror

O que vem a seguir é um mergulho na experiência de Anthony que fica entre a fantasia, o horror e a realidade. O “Homem dos Doces” é novamente invocado e estende seu gancho para todos aqueles que repetem seu nome cinco vezes na frente do espelho, ao mesmo tempo em que Anthony parece preso a essa lenda, tanto mental, quanto fisicamente. Para ele, isso deixa de ser uma lenda e se torna realidade. Na verdade, sempre foi.

O novo filme faz então essa ligação direta com toda mitologia da franquia e coloca Anthony no meio disso. O emaranhado de ideias é divertido, interessante, irá fazer a alegria dos fãs e não deixa de ser uma surpresa. Melhor ainda, aposta na capacidade do espectador de entender que a existência desse monstro sobrenatural passa a ser uma ideia, e não só um assassino místico qualquer.

Por mais que os outros filmes já tenham tentado isso ao construir uma mitologia, o novo filme encara o personagem como uma vingança, não vazia, mas sim carregada da dor e da violência que cessaram a vida dessas pessoas. Os Candymen (com o “e” no plural) não podem mais ser derrotados, mas sim se tornam a possibilidade de revanche. De levanta contra um castigo imposto a um fatia da sociedade que só tinha como culpa a cor de suas peles. A punição contra aqueles que continuam mantendo vivas essa violência.

Mesmo com o maior “body count” da série inteira (16 mortes), o filme não mata nenhum inocente, mas sim aqueles que, sutil ou claramente, estão colocando seus privilégios na frente da capacidade das outras pessoas de serem elas mesmas. E cada uma dessas mortes vale a pena. DaCosta aposta no gore, na violência explícita e no sobrenatural para criar sequências de mortes que não querem ser as mesmas de sempre, mas sim carregadas por um olhar artístico que pode até se afastar da cena, mas cria uma sequência que demorará a ser esquecida.

DaCosta faz um filme lindo e que sabe que deverá se permitir chegar em cenas mais comuns para atingir seus objetivos dramáticos. Portanto, A Lenda de Candyman não é um filme “metido a besta”, um terror que tenta ser mais do que isso (absolutamente “pós” nada!), mas sim um filme de gênero competente, bonito e que tem uma boa história a ser contada.

A violência é um ritual, tanto para o assassino com o gancho no lugar da mão, quanto para DaCosta. Um ciclo de violência que não cessa e que precisa voltar sempre para cobrar o custo disso. Esse novo filme não tem interesse em ser pacifista e levantar uma bandeira branca de trégua, mas sim demonstrar o quanto é preciso lutar e enfrentar esse ciclo que não parecer querer acabar.

DaCosta e Peele sabe disso e colocam isso no filme de modo forte e preciso. Um novo filme para franquia e que, mais uma vez, tem a responsabilidade de ser uma bandeira hasteada. O final, dentro do carro observando mais um capítulo desse ciclo acontecer e a possibilidade de, agora, eles ser interrompido com vingança, deixa claro o quanto o objetivo dos dois é voltar à série, homenagear todos que já passaram por ela, mas, mais do que tudo, demonstram que as vítimas dessa sociedade violenta e preconceituosa não estão sós. E é preciso contar isso a todos.

PS: Para a segurança dos leitores o texto só repete quatro vezes a palavra “Candyman”… cinco agora. Boa sorte.


“Candyman” (EUA, 2021); escrito por Nia DaCosta, Jordan Peele e Win Rosenfeld, à partir do conto de Clive Barker; dirigido por Nia DaCosta; com Yahya Abduk-Mateen II, Teyonah Parris, Nathan Stewarte-Jarrett, Colman Domingo, Kyle Kaminsky, Vanessa Williams e Brian King.


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Trailer do Filme – A Lenda de Candyman

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