A Prece Filme

A Prece | Religioso, mas sem propaganda


[dropcap]V[/dropcap]ocê é religioso? Costuma rezar para Deus? E qual a resposta? Tem certeza? Pois é. A Prece, novo filme do diretor/ator Cédric Kahn, tenta abordar o tema religioso através de uma história de redenção. Disciplinado como é (vide Vida Selvagem), Kahn explora todas as nuances que envolvem a fé e a auto-superação, mas não por um adulto com suas convicções já formadas, mas através de um jovem garoto que precisa aprender a conviver com um grupo que está fora da moda e com sua própria dose de descrédito.

Acompanhamos a chegada do abalado Thomas após uma overdose de heroína, e que não tem esse nome à toa. Referência direta a Tomás de Aquino, este é um filme tomista na melhor de suas intenções, pois evita a todo custo a conversão do garoto por revelação, se concentrando todo o tempo no poder da razão para que ele ultrapasse suas adversidades. Mas claro que há rezas, rituais, e regras rígidas para que a disciplina adentre em sua mente para daí seu corpo continuar são (e salvo).

Este não é daqueles filmes que tentam converter o espectador, pois não se trata de propaganda barata, mas sim uma viagem intimista em busca do que nos torna capazes de suportar as sempre existentes adversidades da vida. Desde suas convulsões iniciais causadas por abstinência da droga até Thomas ser capaz de raciocinar sobre seus próprios passos, A Prece nos apresenta a esse grupo de recuperação que fica próximo de uma pequena vila ao pé de uma montanha belíssima de neve. A natureza no filme se apresente sempre como iluminada, embora aqui e ali tenha seus momentos nebulosos.

E, olhem que interessante, enquanto Thomas não aceita sua verdadeira natureza, ele é na maioria das vezes visto nas sombras e no escuro, dentro do acampamento de jovens. Apenas com sua evolução gradual é que vamos o observando em uma rotina cada vez mais banhada pela luz do sol. Ao mesmo tempo, a interpretação de Anthony Bajon é instrumental para o drama, pois nós só conseguimos entender Thomas através de suas expressões; nunca pelos diálogos. E mesmo quando, mais pra frente, o tímido rapaz está apto a tentar dialogar, as palavras nos dizem menos que seus movimentos de cabeça, seus ombros recuados e seus olhares furtivos.

A Prece Crítica

Não vemos o tempo passar corretamente, mas sabemos que ele se conta em meses e talvez em anos. Isso porque as estações acontecem, incluindo um inverno onde podemos observar a beleza da alvides do local. O que nos ajuda também é entender que existe um tempo para tudo, e é a paciência que recompensa. Enquanto isso vamos acompanhando cada pequeno passo de Thomas em direção à luz ou às trevas. Essa questão permanece aberta do começo ao fim, pois este, como falei, não é um filme maniqueísta. Ele dialoga com o espectador de igual pra igual, de adulto para adulto, e sabemos que no final das contas a fé é um instrumento subjetivo de transformação antes de ser prova de qualquer coisa.

Os espectadores religiosos, cristãos ou não, que estiverem dispostos a largar seus preconceitos durante a sessão poderão se beneficiar da grande força que vem da constatação racional (do filme e de Thomas) de que quando a vida faz sentido é quando Deus está mais próximo, e que não existe espaço para se viver na mentira quando é preciso viver como filho do Criador. A mentira apenas funciona temporariamente, mas como é visto de maneira mais poderosa no filme, ela está sempre fadada a ser uma muleta desajeitada para quem quer de fato andar em vez de se arrastar pela existência.

Econômico em sua narrativa, mas eficaz em sua mensagem, A Prece é um ótimo exemplo de filme religioso que não é propaganda e nem precisa, mas que ironicamente como consequência nos traz uma verdadeira lição de fé, amor e esperança.


“La `Prière” (Fra, 2018), escrito por Aude Walker, Cédric Kahn, Samuel Doux e Fanny Burdino, dirigido por Cédric Kahn, com Anthony Bajon, Damien Chapelle, Alex Brendemühl.

Trailer – A Prece

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