Jornada nas Estrelas III – À Procura de Spock

Em Hollywood o mundo realmente dá voltas, primeiro Leonard Nimoy nem queria que seu personagem de orelhas pontudas fizesse parte do filme anterior. Mas ai eles o convenceram a mata-lo logo no começo, após isso aceitou morrer só no final e acabou até dando jornada-nas-estrelas-iii-a-procura-de-spockabertura enorme para a sua volta… dai para o próprio Nimoy assumir a cadeira de diretor foi um pulo. O bom disso é que Jornada nas Estrelas: À Procura de Spock acaba até ganhando com isso.

Leva a melhor, justamente, por que, pela primeira vez, nada parece obrigação em um filme que, se não ganha pela qualidade técnica, tem um roteiro muito melhor moldado como material original (escrito pelo produtor Harve Bennett) do que o anterior. Na verdade, não melhor, mas simplesmente conseguindo se aceitar muito mais como sendo a continuação da franquia no cinema, aproveitando bem tanto referências do cinema, quanto da série e ainda criando material novo e divertido.

Porém, esse lado simples e objetivo que se sente confortável sendo uma continuação, também prejudica qualquer ambição de ser mais do que isso mesmo. Portanto o único resultado é mais ação, mais naves espaciais, mais fasers e a presença “pra valer” dos eternos antagonistas da tripulação.

Klingons

Ainda que seja uma continuação direta de A Ira de Khan, começando até com a repetição pura do final do mesmo, por incrível que pareça, À Procura de Spock é muito mais robusto em termos de motivações, desfechos e desenvolvimento de seus personagens.

De cara, a ausência física do personagem vulcano faz um bem terrível a sua trama, principalmente por, fisicamente, ele não estar presente, mas todo ponto de partida passar por essa problemática. Um fator que ainda dá espaço para o desenvolvimento honesto e decente da maioria dos outros personagens, principalmente do sempre divertido Dr. McCoy, que acaba carregando a consciência de Spock durante toda trama e se tornando um dos pontos altos do filme, já que precisa viver com sua humanidade entrando em conflito com a famosa lógica o extraterrestre.

Mas infelizmente, tanto esse primeiro momento do médico quanto o espaço que os outros integrantes originais ganham no começo é deixado um pouco de lado quando partem em busca dessa última esperança de terem o Oficial Científico de volta. E essa dinâmica só ganha mais força ainda quando, pela primeira vez, a tripulação da Enterprise age ao invés de ser levada por uma situação. Melhor ainda, acabam se tornando verdadeiros anti-heróis ao sequestrarem a própria nave e partirem contra tudo e contra todos nessa viagem.

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Enquanto isso, para completar esse cenário muito mais rico em motivações que o criado pelo segundo filme, de um lado desse novo Planeta Genesis o recém-descoberto filho de Kirk, David, e a vulcana Saavik monitoram-o, mas acabam sozinhos nele graças ao ataque de uma nave Klingon em busca da tecnologia que resultou na criação desse mundo. Dessa vez sem complexo de Deus nem nenhuma ladainha, só força bruta mesmo.

O bom disso é perceber que, mesmo muito mais simplista e mastigado, À Procura de Spock é um exemplo de como trabalhar bem uma história sem muitas pretensões, mas com um final extremamente climático. Na verdade não só um final climático, mas sim várias resoluções.

Ira Divina

E após praticamente recusar qualquer discussão filosófica no filme anterior, À Procura de Spock tem a oportunidade, o material em mãos, mas deixa que isso só seja discutido fora do filme. Uma opção que pode até parecer proposital, mas diante de mais um enorme numero de escorregões narrativos e buracos, talvez nem o próprio Bennett tenha enxergado esse lado.

Se logo de cara é difícil entender se o corpo de Spock seria necessário para que ele voltasse a se misturar com sua consciência, e se isso é em termos figurados ou não, tudo fica mais complicado ainda quando se descobre que ele foi regredido à bebê e está crescendo enquanto o Planeta Genesis se destrói. Uma opção complicada que parece preocupada demais em estar dentro de um cenário maior do que simplesmente ir ao encontro do personagem. É lógico então que esse “fator rejuvenescimento” acaba soando muito mais como uma desculpa para que o diretor fique longe dos sets do que algo que a história realmente necessite.

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Além disso, é pouco inteligente Kirk não ligar o “problema” do Dr. McCoy com toda história antes de olhar para a gravação do acontecimento. Momento que, por sua vez, só parece existir para mostrar aos espectadores o funcionamento vocal dos “futuros videocassetes” (estamos em 1986, ninguém nem pensava em DVD!) e repetir uma última vez o momento derradeiro e dramático que dita a busca do filme.

Mas o maior acerto do filme é quase imperceptível, já que discute tudo aquilo que foi mostrado nos dois primeiros filmes, mas de modo tremendamente sutil e simples. Se não há Deus nenhum que esteja no mesmo plano que a humanidade, existe a possibilidade que raças muito mais evoluídas acabem se tornando uma espécie divina (o V´Ger), mas nem por isso o homem tem o direito de tentar criar, no sentido bíblico da palavra (como McCoy discute com Spock no filme anterior), mas como isso acontece e o Genesis dá vida a um planeta homônimo (saído do caos etc… etc…), agora é hora de o verdadeiro Deus lembrar que tal disparate deve ser destruído e seu criador castigado.

Bennett fecha o primeiro ciclo de filmes com uma premissa que parece ser boba e produto de uma sequencia frágil, mas com uma conclusão que, definitivamente, chacoalha o status quo da franquia. Spock volta à vida, mas o Planeta Genesis é destruído, assim como seu criador encontra a morte. Três detalhes que, se melhor aproveitados no resto das sequencias (coisa que infelizmente não acontece) poderiam criar um Capitão/Almirante Kirk extremamente mais complicado e profundo do que esse canastrão que não consegue atender uma “teleconferência” sem estar olhando para um lugar que não seja a tela.

Melhor ainda, À Procura de Spock dá fim à Enterprise em um sacrifício heroico digno dos melhores estereótipos (assim como Spock fez no filme anterior). Uma série de decisões inteligentes que não se escondem por trás de uma mais que óbvia sequencia (diante do sucesso dos filmes nos cinemas), mas sim têm coragem de finalizar uma ideia de modo honrado e climático (a luta no Planeta Genesis pode ser óbvia, mas é tremendamente divertida, assim como a batalha entre as duas naves).

FILM : Star Trek III : The search for Spock (1984) Starring DeFo

Um filme correto em quase todos os sentidos, personagens, histórias, conclusões e motivações, sem se preocupar em ser maior do que ele realmente pode ser, mas sim mantendo no foco de sua história não só em um momento ou um vilão, mas sim em um grupo de personagens e a sensação de estar em uma série de filmes independentes entre si, já que sabe que para posicionar o espectador dentro da trama bastava apenas repetir os últimos momentos do filme anterior, talvez único momento dele que fosse realmente importante.

O bom de tudo isso é que agora a série poderia rumar para a galáxia distante que quisesse (o que, para o azar de todos, não acontece).


Star Trek III: The Search for Spock (1984), escrito por Harve Bennett, dirigido por Leonard Nimoy, com William Shatner, Leonard Nimoy, DeForest Kelley, James Doohen, Walter Koenig, George Takei, Nichelle Nichols, Robin Curtis, Merrit Butrick e Christopher Lloyd


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