Ninguém Vai Te Salvar | “Filme de ET” do ano

Se em 2022 o título de “filme de ET do ano” foi para “Nope” (ou Não! Não Olhe, na adaptação ruim do título para o Brasil), em 2023 essa honraria já tem dono, o lançamento direto nos streamings (Hulu nos Estados Unidos e Star+ por aqui), Ninguém Vai Te Salvar. O que ambos têm em comum? Nenhum é sobre alienígenas.

Eles também tem em comum a ideia de parecerem ser a respeito desses seres extraterrestres e sua passagem pela Terra, mas ambos usam isso como pano de fundo para assuntos muito mais complexos, profundos e humanos. No caso de Ninguém Vai Te Salvar isso é ainda mais intenso, ainda que menos escondido. Mas essa também não parece ser a intenção do diretor e roteirista Brian Duffield, que não se esconde por trás de nada. Bem pelo contrário até.

O diretor é conhecido, tanto por sua estreia esquisitona em Espontâneo, mas talvez mais ainda por ter escrito três filmes que são bons exemplos de como fazer algo diferente dentro dos clichês: A Babá, Ameaça Profunda e Amor e Monstros. Mas talvez a ideia de Ninguém Vai Te Salvar vá ainda mais longe.

De cara contando a história de Brynn (Kaitlyn Dever), uma jovem mulher que mora sozinha quase no meio de uma floresta e perto de uma cidadezinha onde ninguém gosta dela e fazem questão de ignorá-la. Brynn, em toda sua excentricidade, parece guardar algum segredo com essas pessoas, mas isso fica logo em segundo plano quando acorda em uma noite com um barulho e descobre um alienígena em sua sala.

O que vem na sequência é um espetáculo que mistura terror com ficção científica e que faz os espectadores lembrarem do quanto o cinema ainda pode ser feito de imagens e ação, sem necessariamente ter diálogos. No caso de Ninguém Vai Te Salvar, tirando algumas comunicações incompreensíveis entre os ETs, o roteiro apresenta apenas oito linhas de diálogo, e acreditem, isso é muito mais do que necessário para entregar um dos filmes mais interessantes do ano.

Brynn não é nem por um segundo uma vítima qualquer de qualquer filme semelhante, e do momento que percebe sua força, não desiste nunca de enfrentar aquilo que a está colocando em perigo. Talvez sejam os aliens, mas talvez também seja algo além disso. É essa mistura que torna o filme imperdível.

Do mesmo jeito que Duffield não esconde os extraterrestres e faz disso parte de toda diversão, também não esconde a alegoria com que quer montar seu filme. Brynn enfrenta seus inimigos cara a cara, com poucas sombras ou aparições escondidas, tudo é claro e visualmente desafiador. Afinal, todo mundo já viu um monte de camaradas de outros planetas e tentar surpreender alguém com isso beiraria a perda de tempo, que é o oposto do que acaba acontecendo. Os aliens de Ninguém Vai Te Salvar ficam naquela categoria de “greys clássicos”, mas com algumas pequenas surpresas. Sem exagero e sem nada para tirar a atenção daquilo que é importante. Entretanto, falar disso sem spoilers se mostra então algo bem complicado.

Enquanto Brynn desce o cacete em todos aliens que cruzam sem caminho, fará disso sua expiação, quase no sentido mais bíblico possível. Se ver diante da possibilidade de morrer sem reparar essa sua culpa não é uma opção para ela. Ao mesmo tempo é daí que ela enxerga a única possibilidade de se purificar, seja pelo tempo, seja por qualquer outro jeito. Mas seu castigo é a única saída, e esses extraterrestres estão lá para servirem de opção mais rápida para isso.

O trabalho de Dever para encarar essas duas faces da mesma personagem é impecável. Do desespero à força. Da melancolia e da fragilidade, até uma vontade que faz seus inimigos, de seus jeitos, admirarem essa característica que foge do resto de suas vítimas, sem a coragem para enfrentarem seus medos e arrependimentos. É essa dor que move Brynn, e é o trabalho incrível de Dever que faz isso ser absolutamente crível, empolgante e, em certos momentos, desesperador.

Duffield coloca sua protagonista em um local de pura adversidades, é praticamente impossível achar que ela terá força para enfrentar aquele perigo, mas é o que está dentro dela, essa vontade de se redimir para ela mesma, de deixar de sofrer, que a move.

Brynn constrói uma versão em miniatura de sua cidade na própria sala. Um lugar onde ela não é odiada e pode ser perdoada por seu erro. Mas ela mesmo deverá matar sua versão sem culpa e livre de dor antes de entender que o problema não é esquecer, mas sim aprender a conviver sabendo.

Ninguém Vai Te Salvar é sobre isso, sobre o quanto ninguém irá até ela salvá-la e ela é a única responsável por enfrentar seus problemas. Isso acontece, nem ela e nem os extraterrestres esquecerão disso, mas, pelo menos, todos aprenderão a conviver com os erros das pessoas e com o quanto elas podem mudar, se redimir e se transformar.

Tudo isso, é claro, com muita tensão, terror, extraterrestres e até alguns momentos bem nojentos para a felicidade dos fãs de um bom gore. Com ainda uma história que vale a pena ser conferida, entendida, sentida e lembrada por bastante tempo depois do final desse filme imperdível.

“No One Will Save You” (EUA, 2023); escrito e dirigido por Brain Duffield; com Kaitlyn Dever, Elizabeth Kaluev, Zack Duhame, Lauren L. Murray, Geraldine Singer, Dane Rhodes, Evangeline Rose e Dari Lynn Griffin

SINOPSE – Uma mulher enfrenta a invasão de extraterrestres enquanto precisa lidar com os erros de seu passado.

Trailer do Filme – Ninguém Vai Te Salvar

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